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Família Megalopygida inclui mais de 200espécies, entre elas a chamada lagarta-de-fogomuito comum em todas as regiões do Brasil
Thereza Venturoli - Agência Fapesp
São Paulo – Mais
da metade de todas as espécies animais conhecidas são insetos. Mas como
espécies com um sistema imune tão pouco desenvolvido – principalmente se
comparado aos mamíferos – evoluíram ao longo de 350 milhões de anos e
sobrevivem hoje nos mais diversos ambientes do planeta, até nos mais
hostis? Estudos indicam que o segredo está em substâncias presentes na
hemolinfa, o fluido que exerce a função de sangue nos insetos. Trata-se,
no geral, de substâncias que, nesses animais, têm a capacidade de
combater vírus, bactérias e fungos.
Tem, portanto, potencial para
reduzir a ação dos microrganismos em humanos. Conhecer essas substâncias
e seu mecanismo de ação é um grande passo para o desenvolvimento de
medicamentos.
Pesquisadores
do Instituto Butantan, em São Paulo, têm identificado substâncias
promissoras em lagartas. “Há muito se produz substâncias antivirais
originárias de organismos e produtos animais ou vegetais, como
ouriço-do-mar e própolis. Mas pouco se investiga em insetos, e menos
ainda em lagartas”, disse à Agência Fapesp o virologista Ronaldo
Zucatelli Mendonça, responsável pela pesquisa “Bioprospecção de
proteínas de interesse farmacológico e biotecnológico na hemolinfa de
lagartas da família Megalopygidae”, que conta com apoio da Fapesp.
A
equipe de Mendonça encontrou substâncias de alta potência antiviral em
lagartas da família Megalopygidae. “Ainda não sabemos exatamente a
composição química dessa substância”, disse. “No entanto, ela já
demonstrou ter ação inequívoca: tornou 2 mil vezes menor a replicação do
picornavírus (parente do vírus da poliomielite) e 750 vezes menor a do
vírus do sarampo, além de ter neutralizado o vírus da influenza H1N1.”
Segundo o coordenador da pesquisa, esses dados são preliminares. “Até a
conclusão do trabalho, podemos chegar a uma redução ainda maior”, disse.
O
estudo com a Megalopygidae dá sequência a uma pesquisa anterior, na
qual a equipe isolou e purificou uma proteína em outra lagarta, da
família Saturniidae, a Lonomia obliqua. A proteína encontrada na Lonomia
tornou a replicação do vírus da herpes 1 milhão de vezes menor e a
replicação do vírus da rubéola, 10 mil vezes menor. O trabalho foi
publicado na revista Antiviral Research, em 2012.
As duas
pesquisas, sobre a Lonomia e sobre as lagartas da família Megalopygidae,
têm foco em substâncias que apresentam duas propriedades específicas:
ação apoptótica e antiviral. A primeira promove a apoptose (morte
celular programada ou desencadeada para eliminar de forma rápida células
desnecessárias ou danificadas), um processo importante no mecanismo
para controle do câncer. O foco atual da pesquisa com as lagartas
Megalopygidae é sua ação antiviral.
As proteínas em estudo são
produzidas pela tecnologia de DNA recombinante. O gene codificador da
proteína é extraído da hemolinfa, clonado em um baculovírus (vírus que
ataca insetos). Depois, é replicado em células de insetos, que, por sua
vez, produzem as proteínas de defesa (as chamadas proteínas
recombinantes) em grande quantidade.
“A principal vantagem em
produzir a proteína recombinante é que isso torna possível a extração da
substância de maneira mais simples e em maior escala”, comentou
Mendonça. “Antes de chegar à indústria, porém, é preciso verificar sua
ação em organismos, em testes in vivo, e avaliar sua viabilidade
econômica”.
Veneno das taturanas pode matar um homem
As
lagartas estudadas pela equipe de Ronaldo Mendonça estão entre as
taturanas urticantes que fazem mal ao homem. Suas cerdas liberam veneno
capaz de levar à morte. A escolha delas para as duas pesquisas se deveu
ao acúmulo de centenas de carcaças desses insetos no Instituto Butantan,
que sobram depois da retirada do veneno para a produção de soro contra
queimaduras. É dessas carcaças que é retirada a hemolinfa, de onde se
extrai o gene codificante das substâncias de defesa.
A família
Megalopygidae engloba mais de 200 espécies, entre elas a Megalopyge
lanata, chamada lagarta-do-cartucho, cuja mariposa ataca as culturas de
milho no Brasil, e a Megalopyge albicollis, a lagarta-de-fogo. Segundo
Mendonça, os estudos com a Lonomia e com as lagartas da família
Megalopygidae constituem uma porta para outras pesquisas de grande
relevância. “O Brasil tem uma megabiodiversidade em insetos. E todos
podem ter substâncias desse tipo, de ação até maior do que as
encontradas até agora”, disse o pesquisador, que realizou três
pós-doutorados com bolsa Fapesp, dois em Portugal e um no México.
Tribuna do Norte
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